Ribat da Arrifana

Período cronológico:  Período Islâmico

Condições da visita: Acesso livre

Contactos: 282 990 010 (Câmara Municipal de Aljezur) |282 991 011 (Associação de Defesa do Património Histórico e Arqueológico de Aljezur)

Site: https://cm-aljezur.pt/pt/605/r%C3%AEbat-da-arrifana.aspx

Descrição: O Ribāt da Arrifana localiza-se na Ponta da Atalaia, uma península orientada de noroeste para sudeste, a norte do cabo de S. Vicente. Conhecida como Finis terrae (ou Finisterra), esta península está delimitada por escarpas verticais e rodeada pelo Oceano Atlântico. O local é oficialmente classificado como Monumento Nacional.

Contexto ambiental: A área é caracterizada pela predominância de xistos e grauvaques do Carbónico, cobertos por solos arenosos compostos por pequenos seixos e cimento ferruginoso. O sítio encontra-se delimitado por escarpas verticais e rodeado pelo Oceano Atlântico. Do lado sudeste e nordeste existem duas nascentes de água, sendo que uma delas com o topónimo de Fonte Santa. Atualmente, a vegetação da área corresponde a um zimbral costeiro desenvolvido devido à ação do oceano, onde predominam os zimbros, o agraço e a esteva.

Ocupação:

Ribat significa mosteiro muçulmano fortificado, e é isso mesmo que se encontra representado na Ponta da Atalaia, o Ribat da Arrifana. Este sítio, por muitos considerado “quase mítico”, encontra-se mencionado na informação literária medieval islâmica, como sendo um espaço de culto associado ao mestre sufi Ibn Qasi (1100-1151). Este emblemático local terá sido erguido por volta do ano de 1130 e abandonado a 1151, depois do assassinato do seu fundador e perseguição dos seus seguidores. Sabe-se que este é o segundo Ribat descoberto na Península Ibérica – o primeiro foi encontrado em Guardamar (Alicante, Espanha).

O Ribat seria composto por um grande pátio – zona onde se fazia o ingresso para o espaço, mais próxima do mundo profano – por uma escola corânica – madrasa – e por três mesquitas assim como por edifícios onde se faria a iniciação para a doutrina sufi (interiorização das crenças e práticas do Islã conhecida também como mística islâmica). A nascente destas estruturas encontrava-se uma necrópole, com cerca de sessenta e cinco sepulturas, de planta retangular, de diferentes dimensões anexadas as qiblas (parede que liga ao mihrab) das mesquitas. As sepulturas teriam tumuli muito baixos (em terra limitados por muretes de pedras e pequenas estelas anepígrafas. Associado à necrópole estava também o espaço que servia para lavar e preparar os mortos para a inumação. A partir das sete sepulturas escavadas integralmente, sabe-se que os cadáveres, depois de lavados e amortalhados, seriam depositados em fossa funerária, na posição lateral em direção de Meca. Do lado ocidente da península foram encontradas várias construções que formavam quatro mesquitas e um conjunto de estruturas habitacionais. Estes edifícios foram contruídos com alicerces de alvenaria da rocha local e paredes de taipa. Por sua vez, os pavimentos seriam em terra batida cobertos com argamassa de cal e areia, que também revestia as paredes caiadas. As coberturas dos edifícios seriam estruturadas por vigas de madeira e revestidas por telhas de canudo. Este espaço servia para controlar a passagem para o interior do Ribat, segundo os dados arqueológicos seria o local de maior atividade. Do lado sul identificou-se uma mesquita com anexos, localizado num relevo sobranceiro ao mar (possivelmente ocupada por uma personagem mais importante e serviria também de ponto de vigia). Junto a este local foram descobertos restos de um possível muro de orações (e muito provavelmente a primeira construção deste espaço). O espólio encontrado no local seria relacionado com a vida quotidiana, nomeadamente recipientes de mesa (taças, púcaros, jarros, bules, galhetas), loiça de cozinha (fogareiros, alguidares, frigideiras e panelas), vasilhas de armazenamento (cantis, cântaros e potes). Por norma, as cerâmicas encontradas seriam de pastas simples, mostrando a prática do sufismo, tal como vários rolos de chumbo, lucernas e pequenas placas de pedra com inscrições. Em relação aos vestígios de alimentos recuperados, a maioria seriam moluscos marinhos, aves e vestígios de veado, o que indica que a alimentação seria pouco diversificada. Este facto é provado pela análise realizada aos restos humanos, que mostrou que a população residente teria uma dieta pobre em ferro e vitaminas.

O Ribat da Arrifana, edificado no decorrer do século XII, ocupando toda a área da Península (cerca de dois hectares), encontrava-se organizado em sectores, de forma hierárquica. A escolha deste local para edificação do Ribat está relacionada com a necessidade de ser um espaço afastado de zonas urbanas onde residiam os mecanismos de poder religioso, político, militar e económico.  Inclusive, seria uma “zona de fronteira” em termos religiosos (local intermedio entre o mundo material e o espiritual) e políticos (entre muçulmanos e cristãos). 

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Sector 1 do ribāt, com as ruínas do Posto da Guarda Fiscal ao fundo.
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Reconstrução 3D das estruturas do Sector 2.
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Ruínas do minarete (Sector 3).
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Sector 4 das ruínas do Ribāt.

Ibn Qasi, fundou este local em 1130 quando pretendia lutar contra o poder almorávida e almóada (sediados em Silves e Faro). A djhad (guerra santa), pregada por este mestre sufi, tinha como objetivo defrontar todos os inimigos da fé islâmica. Ibn Qasi foi reconhecido como chefe religioso e político (Imām) tal como o messias (mahdī) e, pouco depois viria a ser assassinado em Silves, por ordem dos almóadas. Em causa devido ao pacto de não agressão com D. Afonso Henriques, prevendo-se, assim, no atual território português, a existência de dois estados independentes, um a norte (cristão) e outro a sul (muçulmano).

Depois deste episódio o Ribat foi totalmente abandonado e censurado, e os seus seguidores perseguidos. No entanto, ficaria para sempre registado na memoria coletiva que que a povoação de Aljezur foi fundada por um príncipe-poeta da Arrifana – Ibn Qasi.

Escavações

O Ribat da Arrifana vinha a ser referido desde o seculo XIX por vários investigadores, porém, este local era sempre apontado como sendo situado em locais como o Castelo de Aljezur ou a Ponta do Castelo. Em 2001, o sítio foi devidamente identificado quando Rosa e Mário Varela Gomes são chamados ao local pela autarquia do concelho. Nesta intervenção, foi realizada uma pequena decapagem no terreno que pôs a descoberto o mihrab – nicho sagrado do Ribat – várias mesquitas e oratórios. Devido à degradação à qual o sítio se encontrava exposto, levou a sua intervenção no verão da sua descoberta, através de uma campanha de limpeza e escavação de dois sectores para uma primeira caracterização do arqueossítio As intervenções arqueológicas continuaram nos anos seguintes (2002-2004) com sondagens nos quatro sectores, que revelaram dados muito importantes para a caracterização do sítio Em 2012 o sítio voltou a ser alvo de escavações arqueológicas e, no ano seguinte, terá sido oficialmente classificado como Monumento Nacional. Mais tarde, em 2016, voltou a ser intervencionado, desta vez, com um projeto de valorização promovido entre a autarquia e o Ministério da Cultura, que incluía a realização de novas escavações para a recolha do espólio para a construção de um centro interpretativo (DGPC – SIPA, 2011).

Referencias:

DGPC – SIPA – Sistemas de Informação para o Património Arquitetónico. (2011). Ribat da Arrifana, Portugal, Faro, Aljezur.  In: http://www.monumentos.gov.pt/Site/APP_PagesUser/SIPA.aspx?id=31965 consultado a 20 de Abril de 2023

Gomes, R. V. & Gomes, M.V. (2003). A Djihâd No Extremo Sudoeste Peninsular. O Recém-Identificado Ribat Da Arrifana (Século XII). Revista da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas, Lisboa, 16: 141-159.

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Gomes, R. V. & Gomes, M. V. (2005a). O ribāt da Arrifana (século XII). Resultados de três campanhas de escavações, Al-Rihana (1): 41-71.

Gomes, R. V. & Gomes, M. V. (2005b). O ribāt da Arrifana (Aljezur, Algarve): Resultados da campanha de escavações arqueológicas de 2003 – Sector 1, Revista Portuguesa de Arqueologia, Lisboa, 8(2): 471-533.

Gomes, R. V. & Gomes, M. V. (2005c). A djihād no Extremo Sudoeste Peninsular – O recém-identificado ribāt da Arrifana (século XIII). Revista da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas, Lisboa, 16: 141-159.

Gomes, R. V. & Gomes, M. V. (2006). O ribāt da Arrifana (Aljezur, Algarve): Resultados das escavações arqueológicas no Sector 3 (2003/2004). Revista Portuguesa de Arqueologia, Lisboa, 9 (2): 329-352.

Gomes, R. V. e Gomes, M. V. (2007). Ribāt da Arrifana. Cultura Material e Espiritualidade. Aljezur. Câmara Municipal de Aljezur.

Gomes, R. V. & Gomes, M. V. (2019). A Necrópole Do Ribat Da Arrifana (Aljezur, Portugal). AL-KITĀB, Madrid: 343-352.

National Geographic Portugal (2020). As ruínas arqueológicas da Arrifana. In: https://nationalgeographic.pt/historia/grandes-reportagens/2072-o-ribat-da-arrifana consultado a 23 de Abril de 2023

Zbyszewski, G. & Berthois, L. (1950) – Contribution à l’étude lithologique des formations meubles de la partie Sud-Ouest du Portugal. Comunicações dos Serviços Geológicos de Portugal. Lisboa (31): 5-297