Estação arqueológica do Monte Molião

Período cronológico: Idade do Ferro, período Romano e Islâmico

Condições da visita: Acesso livre mediante marcação (por se encontrar vedado)

Contacto: (+351) 282 771 700 ou geral@cm-lagos.pt

Descrição: A estação arqueológica do Monte Molião encontra-se localizada na margem esquerda do estuário da ribeira de Bensafrim, na periferia da atual cidade de Lagos, a uma distância de 500 metros da linha de costa atual, numa colina de forma elipsoidal com cerca 30 metros de altitude. Este sítio revela uma longa ocupação que remonta à Idade do Ferro e continuou até ao período islâmico, evidenciado a importância estratégica desta região ao longo do tempo.

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Contexto ambiental: Durante o primeiro milénio a.C., o estuário da Ribeira de Bensafrim era formado por um cordão dunar circunscrito pela ribeira de Bensafrim. A área apresenta um substrato geológico composto por areias e arenitos vermelhos e seixos ruborificados Plio-Plistocénicos. O cerro oferece uma vista panorâmica sobre a região, tornando-o estrategicamente vantajoso tanto para fins defensivos quanto comerciais.

Ocupação: Durante a Idade do Ferro, o Monte Molião seria um povoado com dimensões consideráveis, onde se sobressaem técnicas urbanísticas e arquitetónicas pouco comuns no panorama da Idade do Ferro tardia do Ocidente. Esta técnica consistia na prática do afeiçoamento da rocha, na qual fariam uma escavação na rocha calcária local, em formas retangulares e quadrangulares, obtendo assim o chão das habitações. As paredes, por sua vez, seriam em taipa e eram marcadas pelos limites dessas mesmas depressões. Neste primeiro momento de ocupação identificaram-se vários artefactos cerâmicos, nomeadamente ânforas, cerâmica de “tipo Kuass” e cerâmica comum que representavam uma ocupação tardia da Idade do Ferro, provenientes da baía de Cádis e do mediterrâneo Oriental, demonstrando o dinamismo comercial do Monte Molião.

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Recolha de ânforas no decorrer da campanha de escavação de 2019 (Fototeca Câmara Municipal de Lagos; Francisco Castelo, 2019)

O final do século II a.n.e e o final do século II d.n.e correspondem à ocupação romana no sítio arqueológico (período Romano Republicano e período Romano Imperial), altura em que as populações itálicas se instalam no território algarvio. Foram identificadas várias estruturas habitacionais e funcionais (como por exemplo, fornos de cerâmica, áreas de produção metalúrgica, cetárias) que se encontravam organizadas em arruamentos. As peças arqueológicas que se encontram associadas a estas estruturas, devem ser destacadas pela sua abundância, variedade e estado de conservação. Deste vasto número, podem se destacar as cerâmicas campaniense A, cerâmica comum, cerâmica terra sigillata, cerâmicas paredes finas e vários tipos de ânforas, que evidenciam as relações comerciais de âmbito regional e com o mediterrâneo (Arruda et al. 2008). Foi, justamente no decorrer deste período que surgem indícios de que esta zona poderá ter correspondido à antiga Lacobriga (cidade romana enumerada por vários escritores da época, como por exemplo Pompónio Mela e Plutraco) porém, esta possibilidade nunca chegou a ser provada.

No final do século II d. C., é evidente um crescimento da população que expande a sua ocupação até a margem direita da ribeira de Bensafrim (atual cidade de Lagos). A ocupação do sítio torna-se mais restrita, com uma intensificação de atividades industriais, evidenciado pelos quatro fornos dispostos no sector C. Os fornos seriam compostos por várias fiadas de laterae e tegulae ligados por um sedimento argiloso e compacto, em que as suas plantas e orientações variam muito entre si. Mais uma vez, o conjunto artefactual é abundante e variado, devendo ser destacados a cerâmica comum de produção local, os fragmentos de ânforas, de terra sigillata (principalmente de produção sudgálica, mas também hispânica e africana), cerâmica de paredes finas (produzida na área de Cádiz) e de cerâmica de cozinha africana. 

Encontra-se, ainda, associado a este emblemático sítio arqueológico, uma necrópole romana, quase totalmente destruída no final do seculo XX. Neste espaço foram identificados rituais de cremação e inumação, tal como o espolio votivo, correspondente aos séculos I – II d.n.e (contemporâneo da ocupação do Monte Molião) e no século III d.n.e.

Assim, pode afirmar-se que ocupação de Monte Molião durou cerca de 550 anos, entre os séculos IV a.n.e e II d.n.e. 

A longa diacronia não facilita a interpretação da ocupação do sítio, dada a sua utilização ao longo de vários séculos, onde são evidentes reparações, demolições e reconstruções que nem sempre se apresentam absolutamente diferenciáveis do ponto de vista estrutural ou estratigráfico. Porém este sítio terá sido marcado pela indústria pesqueira e produção de sal que foram essenciais à sua sobrevivência, tal como para as trocas comerciais – a avaliar pelas importações registadas de produtos alimentares e manufaturados vindos de Itália, Gália, Bética e Norte de África. 

Escavação: Este sítio foi identificado por Estácio da Veiga, no final do século XIX, no âmbito da Carta Arqueológica do Algarve. Mais tarde, terá sido intervencionado por Santos Rocha, que procedeu à escavação apenas da necrópole romana. A partir do final do século XX foram realizados diversos trabalhos arqueológicos, no âmbito de projetos de salvaguarda contribuindo, na sua maioria, para dados sobre a ocupação humana. Entre 2006-2009, uma colaboração entre a Câmara Municipal de Lagos e o Centro de Arqueologia da Universidade de Lisboa (UNIARQ) permitiu a escavação do sítio continuamente (cinco campanhas de trabalhos de campo), em três sectores, perfazendo uma extensa área de 527 m2.

As intervenções arqueológicas permitiram datar o sítio entre os finais do século IV a.n.e. (II Idade do Ferro) e os finais do século II d.n.e. (período romano), bem como materiais integrados na Antiguidade Tardia (século IV d. C.).

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